Ilustração: Chana de Moura
Quando dizemos que estamos “lutando pela saúde das mulheres”, estamos dizendo: queremos que as mulheres e todas as pessoas tenham vida plena, que possam desfrutar de seus corpos, mentes e espíritos saudáveis. Mas, em nossa cultura, cuidar da saúde está muito mais vinculado à ideia de doença do que à manutenção harmônica das funções fisiológicas do corpo.
O corpo humano vem sendo controlado desde o início da dominação da medicina ocidental. Porém, a medicalização dos corpos das fêmeas tem sido sistemática, uma vez que eles têm o poder da procriação. Desde a infância, as meninas iniciam suas experiências de enquadramento dentro de padrões sociais, que mais tarde continuarão em outros formatos. A primeira menstruação, que é um marco profundo, tem, no lugar da celebração deste rito de passagem, sua “iniciação” nos ritos de cuidado ocidentais: a primeira consulta com o ginecologista — que tem em sua especialidade a lida com a doença, onde provavelmente receberá uma pílula contraceptiva (ainda que não tenha iniciado sua vida sexual ou nem tenha definida sua orientação sexual) — ao invés de procurar uma enfermeira, obstetriz ou educadora em saúde que possa dar as boas-vindas ao novo ciclo de vida e orientar sobre seus autocuidados. Essa jovem poderá engravidar por vontade ou falta de orientação, e mais uma vez o domínio de decisão e entendimento dos processos estão sob o poder de outro: seja daquele mesmo ginecologista ou do parceiro.
Durante as gestações, é comum observar a total falta de conhecimento das mulheres sobre os processos que estão acontecendo dentro de si mesmas. Por que não são incentivadas a serem as primeiras a terem domínio de si, seus corpos, processos e cuidados? A história reprodutiva prossegue: as que irão parir poderão vivenciar esse momento da forma mais amorosa, respeitosa e responsável que têm direito ou poderão passar por mais violências de gênero, por habitar um corpo que não obedece enquadramento, um corpo que produz vida, que pulsa em seu próprio ritmo.
A menopausa, que marca uma mudança de ciclo vital, não é “um fim”, é uma fase de importantes processos nos corpos, mentes e corações das mulheres maduras. Em nossa sociedade linear e mecanicista, que só valoriza o jovem, (re)produtivo e sexualmente ativo (afinal, a função do sexo ainda é vista somente como procriativa), a menopausa não cabe e, por sua vez, o corpo que habita este processo, é tratado como um corpo em desuso.
No dia de celebrar a saúde das mulheres — e de todas pessoas que ocupam corpas de fêmea —, convidamos você a refletir sobre quais recursos possui para ter mais autonomia e autodeterminação em seus cuidados, e também a celebrar o seu acesso à água potável, alimentos saudáveis e agroecológicos, informação segura e confiável e profissionais de saúde respeitosos — e refletir sobre quem tem ou não acesso a tudo isso. Que cada uma de nós seja a protagonista da sua própria saúde!
Ellen Vieira
www.bruxariadistro.com
Esse texto faz parte da edição de 2021 da Mandala Lunar