Não há dúvidas de que a hegemonia do conhecimento científico precisa ser questionada. No entanto, o cenário atual nos expõe às consequências da negação e da desconsideração de evidências acumuladas há décadas pelas ciências. A crise climática que se intensifica, as pseudociências já refutadas ressurgindo das cinzas e as teorias da conspiração que favorecem estratégias de manipulação política são apenas alguns desdobramentos desse cenário que nubla as fronteiras entre verdade e mentira. Diante do excesso de informações incertas que nos atravessam e tendo nossas capacidades críticas desafiadas, parece urgente revermos como a ciência funciona e a importância do embasamento científico.
O principal propósito da ciência é aumentar nossa compreensão sobre os fenômenos que nos cercam. Através dela, podemos mergulhar na busca pelo o que está oculto e desvendar maravilhas profundas. Ela possibilita a ampliação dos nossos sentidos, pois fornece explicações de maneira mais objetiva e fundamentada que o senso comum é capaz de proporcionar. Com base em critérios científicos, perguntas são feitas, métodos são seguidos, hipóteses são testadas e dados requerem evidências adequadas para serem aceitos. Ao contrário do que possa parecer, resultados isolados raramente são evidências suficientes para traçar conclusões gerais. Por essa razão, o conhecimento científico se constrói ao longo do tempo através da replicabilidade de resultados e de discussões que guiam a elaboração de um consenso entre pesquisadores. O processo de construção da ciência se faz através da revisão constante do conhecimento. É isso que a torna especial: a ciência prospera através de seus erros, avança ao desvendar suas próprias contradições e refuta a si mesma frente a novas evidências. Dessa forma, ela nos provoca a revisar nossas crenças constantemente e a considerar a possibilidade de as nossas percepções estarem equivocadas, convidando-nos a acolher as melhores evidências disponíveis até o momento.
Apesar de constantemente informadas sobre suas descobertas, somos pouco estimuladas a entender como as práticas científicas realmente funcionam. Mas há um movimento para que a ciência seja uma construção cada vez mais aberta, coletiva, plural e ciente de seus próprios vieses – pois tradições também se reinventam. O lugar que ela ocupa não deveria invalidar outras formas de conhecimento, visto que uma realidade diversa também se expressa na abundância de formas de saber. Isso quer dizer que, em algumas situações, a ciência é a nossa melhor alternativa e, em outras, não. No entanto, compreendendo como ela funciona, podemos perceber que ela nos é útil, que amplia o nosso olhar crítico e que pertence a todas nós.
Texto de Maria Eduarda Appel
Ilustração de Julia Vargas