Por Anelise De Carli para a Mandala Lunar 2022
O conteúdo dos sonhos é fugidio. A psicologia pós-junguiana ensina que os sonhos já cumprem seu papel simplesmente por terem sido sonhados. No entanto, lembrar dos sonhos pode aprofundar esse potencial e ser uma poderosa ferramenta de autoconhecimento, porque eles nos revelam muito sobre o que está acontecendo nas nossas emoções e no nosso inconsciente. Para trazer os sonhos do inconsciente para o consciente existem algumas técnicas que variam de cultura para cultura. Se você tem desejo de lembrar dos seus sonhos, aqui apresentamos algumas sugestões.
Para sonhar bem é preciso dormir bem. Por isso, é aconselhável evitar substâncias estimulantes e inibidoras do sono. Também as que causam sonolência devem ser evitadas pois, com elas, temos uma espécie de “desligamento cerebral temporário”, diminuindo o tempo do sono REM.
A nossa consciência precisa ser encaminhada de maneira direta e enfática para suas atividades. Instantes antes de perceber que vai adormecer, mentalize ou fale para si mesma algo como “vou sonhar, lembrar e relatar”. Esse é o princípio da autossugestão. Nomear nitidamente a intenção através dessas afirmações ajuda a encaminhar nossa consciência para as tarefas que desejamos que ela cumpra.
O segundo passo é facilitar a realização da tarefa. Ajuda manter perto do lugar onde se dorme algo para anotar o sonho: um lápis e um caderno ou a sua Mandala Lunar. Evite aparelhos eletrônicos como o celular, pois as informações que acessamos através dele podem levar a mente recém desperta a se concentrar em outra coisa e rapidamente perder o fio da meada da recordação do sonho. Facilitar o acesso aos recursos de anotação faz com que a escrita seja a primeira coisa que você faça ao acordar. Além disso, evita que exijamos do nosso corpo muitos movimentos logo depois de despertarmos. O nosso corpo e a nossa consciência estão intimamente ligados. Quando movimentamos o corpo, ativamos também algumas lógicas organizadoras do pensamento – algo que chamamos de regime antropológico do imaginário. Para isso, ajuda nos mantermos imóveis durante uns minutos logo após despertar enquanto tentamos nos concentrar somente nas recordações do que estávamos sonhando.
Quando começamos a praticar a anotação dos sonhos, é comum que seja difícil lembrar de muitas coisas nitidamente. Valorize qualquer rastro. Anote mesmo se você lembrar apenas de um detalhe, objeto, cor ou sensação. Ao escrever, concentre-se nesse rastro, pois dele podem brotar outras partes do sonho. Se não vier, tudo bem. No outro dia, continue. Concentre-se na periodicidade. A memória é uma capacidade a ser treinada e com a memória dos sonhos acontece o mesmo. Como a filosofia do yoga ensina há séculos, nos tornamos bons naquilo que praticamos. Quanto mais praticamos lembrar deles, mais lembramos. Quanto mais praticamos esquecê-los, mais esquecemos.
Por último, aprenda a contar histórias. Lembrar dos sonhos não é só uma questão de boa memória, mas de domínio da prática narrativa. Em algumas sociedades, existe o costume antigo de narrar os sonhos para um grupo. Algumas famílias hoje mantêm essa prática ao compartilharem suas memórias durante o café da manhã. Quando pequenos, aprendemos a contar histórias ouvindo histórias que nos são contadas. Com o tempo, vamos dominando a arte de narrar os acontecimentos da nossa vida acordados. Mas se às vezes é difícil contar algo que nos passou, fica ainda mais desafiador contar uma história que não tem uma linha narrativa muito lógica como são as histórias dos sonhos. Por isso, para começar a anotar seus sonhos em um sonhário, ajuda bastante cultivar um diário – que também pode ser a sua Mandala Lunar, com uma cor para escrever as lembranças da vigília e outra cor para as dos sonhos. Antes de dormir, escreva as coisas que se passaram ao longo do dia. Pode ser um texto curto ou como fizer sentido para você. O importante é levar a atenção para o registro das memórias. Depois, quando acordar e for anotar lembranças dos sonhos, não se preocupe com “contar uma história”. Temos a tendência de preencher as associações estranhas das imagens oníricas com nexos causais, mas lembre-se que não é assim que a linguagem dos sonhos funciona.