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Um percurso de escuta do corpo e suas muitas curas | Relato pessoal

De repente, um cansaço extremo, dificuldades que iam de fazer um exercício simples a calorões no rosto. Com 43 anos, algumas coisas eu sabia sobre mim e uma delas era que meu ciclo era regular desde o retorno da menstruação após o nascimento da minha filha, por 11 anos. Antes disso, alguns anos entre diagnóstico e tratamento para endometriose.

Quando olhei minha Mandala Lunar e observei que, além dos calorões no rosto, o ciclo estava absolutamente imprevisível, e minha pele oleosa, imaginei que pudesse estar na perimenopausa. Quando algumas dores pélvicas começaram e a barriga inchou, decidi que já tinha informações o suficiente para buscar assistência.

Moro em uma cidade grande, em um lugar central, e o posto de saúde é o meu recurso. Aqui, no posto de saúde, começa a história que eu quero contar: chegando lá, num quadro de pós-covid e com todas essas observações, fui acolhida por uma médica jovem e vinda do outro lado do país. A escuta da Dra. Lorena fez uma imensa diferença: vamos pesquisar! O nível de desconforto, a fragilidade desse sistema imunológico, a dor pélvica e o histórico de endometriose: nada disso pode passar batido.

A escuta de Lorena foi o ponto crucial para o que vem adiante: ela não minimizou, não me receitou algo superficial ou apontou algo apenas somático como causa. Investigamos: inúmeros exames de sangue e encaminhamento para ginecologia. Esses exames apontaram algumas alterações, mas não eram de natureza hormonal.

Assim cheguei na Dra. Bianca, ginecologista de outro posto de saúde, e estabelecemos, juntas, uma estratégia que passava por colocar o DIU Myrena, já que estava difícil organizar a ordem dos fatores — a anemia, a investigação da endometriose e a percepção de crises epilépticas que pareciam voltar a acontecer. Ah, sim, sou epilética. Quando descobri, aos 28 anos, estava com endometriose.

Naquele momento, tomei para mim a tarefa de me observar: quando meu corpo ficava sobrecarregado, com infecções ou inflamações, nesse momento é que as crises vinham. Quando adquiri minha primeira Mandala Lunar (que foi a primeira feita), meu objetivo era bastante ligado a esta descoberta: anotando minhas percepções sobre meus dias, eu conseguia me ajustar de tal maneira a evitar as crises de ausência. Dito isso, tanto Lorena quanto Bianca, profissionais do SUS, ficaram atentas para o que eu já sabia sobre mim. Meu namorado na época também me escutou: foi ele quem insistiu para que fizéssemos via particular a ecotransvaginal, que levaria um tempo para ser realizada pelo SUS. E, nessa eco, descobrimos um tumor de ovário. Bem grande. Liguei para o atendimento ginecológico e falei com a médica: ela pediu mais exames, me acolheu, me pediu notícias no encaminhamento para a cirurgia.

São muitas sensações confusas quando a gente recebe um diagnóstico, mas vou ficar com a principal: eu SABIA que existia algo errado. Foi preciso que duas médicas me escutassem, que meu namorado me escutasse, mas, principalmente, que eu mesma me escutasse e me levasse a sério em minhas percepções — um trabalho de amor. Quando o sistema é um sistema de saúde (e não um sistema de doença), as pessoas envolvidas nas consultas criam significados juntas.

Muitas são as camadas de cura nessa trajetória: enquanto aguardo a cirurgia, percebo que estou mais confiante no que intuo e percebo em mim e no meu corpo. Sigo também com meus cuidados de ervas, chás e rezos, com o amor dos meus afetos, com meus registros na Mandala e conto esta história para vocês como quem divide uma preciosidade: que todas tenhamos acesso à cura da confiança.

Texto de Michele Zgiet, filha de Maria Clara e mãe de Cecilia. É coordenadora conjunta do selo Orisun Oro (mulheres amefricanas publicando Poetas Amefricanas), doula de textos, redatora da Mandala Lunar e colunista do Consultório de Descansologia no Jornal O Onírico.

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