Hoje temos consciência do estado preocupante em que se encontra o mundo que herdamos em razão das más escolhas tomadas por gerações passadas, guiadas por ideais coloniais que viam a natureza apenas como fonte de recursos a ser explorada em nome do “progresso”. Sabemos do aquecimento da atmosfera, da acidificação dos oceanos e da extinção de ecossistemas. Compreendemos também que a forma de vida que muitas vezes ajudamos a perpetuar é fonte desses eventos. Seria imoral saber o que sabemos hoje e não fazermos nada para mudar a realidade. Para superar padrões destrutivos reproduzidos há séculos, precisamos nos empenhar para tornar real o outro mundo que buscamos. Manifestar essa mudança envolve um novo entendimento de quem somos e de quais são os verdadeiros propósitos da nossa existência. Por isso, é importante vislumbrarmos um futuro que abrace quem gostaríamos de ser se tivéssemos a oportunidade de explorar todos os nossos sentidos e potencialidades sem restrições.
Nesse processo, é preciso compreender que nós, humanas, não somos mais importantes que qualquer outra forma de existência. Ainda assim, temos de insistir que somos importantes diante desse nosso compromisso com o futuro. Embora esse seja um trabalho coletivo, é crucial lembrar que não se pode mudar um mundo sem modificar suas partes. Qualquer mudança no cosmos altera a cada uma de nós também. A transição pode ser lenta, mas não é impossível. Para garanti-la precisamos deixar morrer certas ilusões. Devemos cultivar a imaginação e criar algo novo a partir do velho. Acolher dentro de nós as mudanças necessárias para a regeneração pode significar abandonar um hábito que nos é nocivo, conversar com outras pessoas, participar de um projeto comunitário ou mesmo acompanhar o crescimento de uma planta. Somente quando estamos imersas na realidade dessas pequenas ações percebemos seu potencial revolucionário, pois presenciamos a beleza dos processos ínfimos que lentamente modificam a vida.
Ser capaz de planejar e realizar ações pensando além da nossa geração – e além da nossa espécie – é uma forma de honrar o planeta que nos acolhe. É retribuir à natureza ao invés de explorá-la. Mesmo empurrados para a periferia da existência pelas forças coloniais, os povos indígenas nos ensinam que uma boa ancestral é aquela que pisa leve na Terra. A forma através da qual trilhamos nossa existência, conservando valores e agindo no mundo, esculpe a realidade que coabitamos. Esse é o legado que transmitiremos para o futuro. Quando semeamos um caminho de beleza, retribuímos ao mundo com mais beleza. Cada pequeno gesto é parte do que regenerará a vida na Terra. Empenhadas nessa tarefa transgeracional, permitimos às próximas irem mais longe do que jamais imaginaríamos.
Texto de Chana de Moura
Ilustração de Julia Vargas
Mandala Lunar 2022